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sábado, 27 de junho de 2015

A MAIS IMPORTANTE MUDANÇA TRAZIDA PELO NOVO CPC

 O jurista e filósofo estadunidense Roscoe Pound ensinava que “o direito deve ser estável, no entanto, não pode ser estático.”

Essa frase parece encaixar-se como uma luva àquela que materializará a mudança mais significativa de tudo o quanto cuidou o novo Código de Processo Civil.
O novo Código de Processo Civil (lei nº 13.105, de 2015), em seu art. 927, I e II, determina a juízes e aos tribunais a observância das decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade e os enunciados de súmula vinculante.
Até aqui nada de novo porquanto, nesse caso, já há no ordenamento a previsão de reclamação constitucional quando juízes ou tribunais (ou mesmo órgãos administrativos), em relação às decisões do STF em controle concentrado (ações diretas e ADPFs):
a) usurpem a competência do STF;
b) desrespeitem ou descumpram as referidas decisões;
c) não aceitem a autoridade das súmulas vinculantes.      
    A Reclamação, relembre-se, está prevista no texto constitucional (artigo 102, inciso I, alínea “i”) e deve ser ajuizada diretamente junto ao STF.

    De outro modo, contudo, quando o mesmo artigo 927, nos incisos III, IV, e V, do novo Código de Processo Civil impõe aos juízes e aos tribunais a observância de precedentes originados no controle difuso (caso concreto e inter partes), fora de dúvida, emerge para o mundo jurídico algo de muito novo e que, certamente, suscitará intensos debates na comunidade jurídica.
  
    Eis que as referidas disposições obrigam juízes e tribunais à observância de:   

   a) acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos (STF e STJ, respectivamente);

   b) enunciados das súmulas do STF (não vinculantes ou persuasivas) em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;

   c) da orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados os juízos.

   Em tais casos, para deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, deverá o julgador demonstrar:

   a) a existência de distinção no caso em julgamento ou;

   b) a superação do entendimento.

  Assim, sem embargo de que integre o sistema jurídico romano-germânico (civil law), o ordenamento processual brasileiro parece perfilhar parcialmente a chamada teoria do stare decisis, que como se sabe advém da expressão latina stare decisis et non quieta movere (mantenha-se a decisão e não se modifique o que foi decidido), modelo que alcança sua maior expressão nos Estados Unidos, país que adota o sistema do common law.[1]

    Tais disposições, conforme inspiradas no referido sistema common Law, materializam o distinguishing (quando ocorre distinção entre o caso em julgamento e o precedente-paradigma), e o overruling (técnica na qual se reconhece em um precedente a perda de sua força vinculante e assim pode ser substituído).[2]

    No primeiro caso (a existência de distinção no caso em julgamento), aplicar-se-ia o chamado stare decisis vertical (binding effect): a ratio decidendi firmada no precedente será de observância obrigatória pelos tribunais hierarquicamente inferiores.

  Na segunda hipótese (a superação do entendimento), em muito se assemelha o stare decisis horizontal: a ratio decidendi firmada no precedente será de observância obrigatória pelo tribunal que a formulou, ou seja, o tribunal deve obediência aos seus próprios precedentes.

    Desse modo, quer nos parecer, definitivamente, instalou-se o sistema de precedentes no ordenamento jurídico pátrio.
     
     Nesse sentido, a nova sistemática inaugurada pelo Código de Processo Civil busca ainda a aplicação dos princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia (que é a feição horizontal do stare decisis) e ambiciona alcançar todos os juízos e tribunais, inclusive o próprio Supremo Tribunal Federal (em recursos extraordinários repetitivos).
     
      Tais mandamentos estão presentes na redação do § 4º do art. 927, do novo CPC. Senão, vejamos:  
 “§ 4o A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.”
 Por Airton Portela, Juiz Federal e Professor, ex-Advogado da União, ex-Procurador Federal e ex-Analista

[1] No direito estadunidense a decisão proferida pela Suprema Corte é obrigatória para todos os juízes e tribunais, e, portanto, a declaração de inconstitucionalidade em um caso concreto traz como consequência a não aplicação daquela lei a qualquer outra situação, porque todos os tribunais estarão subordinados à tese jurídica estabelecida. De modo que a decisão, não obstante referir-se a um litígio específico, produz efeitos gerais, em face de todos (erga omnes). (BARROSO, 2012, p. 71).
[2] Conforme disposições contidas nos artigos. 489, § 1º, combinado com o artigo 927, § 1º, do novo Código de Processo Civil.

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