Texto baseado na obra Manual de Direito Constitucional - Volume II- Airton Portela |
A Emenda Constitucional nº 86 tornou
obrigatórias a realização de emendas parlamentares individuais. Rápida
digressão nos permitirá entender como, porque e em que contexto isso se deu.
Por uma conceituação mais simples,
orçamento é o instrumento legal autorizativo aprovado pelo Poder Legislativo para
atuação do Poder Executivo para a realização de receitas e despesas.
Nesse processo, as chamadas emendas
parlamentares individuais, feitas ao Orçamento Geral da União, denominado de
Lei Orçamentária Anual (LOA)
– enviada pelo Executivo ao Congresso, anualmente –, são proposições por meio
das quais os parlamentares podem interferir no endereçamento de recursos
públicos, nesse caso destinado parcelas destes, via de regra, as suas bases
eleitorais.
Existem quatro tipos de emendas feitas ao
orçamento: individual, de bancada, de
comissão e de relatoria. As emendas individuais, que nos interessam
diretamente nesta reflexão, são de autoria de cada parlamentar.
Ocorre que as emendas parlamentares
individuais até a entrada em vigor da EC 86 não tinham caráter vinculante posto
que conceituadas como transferências intergovernamentais voluntárias. Com
efeito, quase sempre eram utilizadas como “instrumentos de governabilidade”,
ou, de forma mais direta, “moeda de troca” que forçava os parlamentares a
votarem favoravelmente as proposições do Poder Executivo, pois do contrário
suas emendas eram contingencidas.
A fim de conferir maior independência aos membros das
casas legislativas em relação ao Poder Executivo, a Emenda Constitucional nº 86
estabeleceu a obrigatoriedade da programação orçamentária prevista nas emendas
parlamentares individuais nos seguintes termos:
1) Foi
estabelecida uma vinculação de receitas para gastos com emendas parlamentares
individuais no percentual de até 1,2% da receita corrente líquida prevista no
Projeto de Lei Orçamentária enviado pela União. Todavia, metade desse
percentual deverá destinar-se a ações e serviços públicos de saúde
(artigo 166, parágrafo 9o), inclusive para custeio, sendo vedado seu uso
para pagamento de despesas com pessoal ou encargos sociais (artigo 166,
parágrafo 10), mas este valor que será aplicado em saúde será considerado
no montante anual que a União obrigatoriamente deve despender (artigo 166,
parágrafo 10);
2) Esse
percentual de 1,2% será executado de forma equitativa (artigo 166,
parágrafo 11), assim entendendo-se a igual e impessoal divisão de recursos
entre todas as emendas parlamentares (artigo 166, parágrafo 18),
independentemente da autoria;
3) A
obrigatoriedade da execução orçamentária das emendas parlamentares individuais
somente cessará quando ocorrer impedimento de ordem técnica (artigo 166,
parágrafo 12), ou seja, obstáculo que impeça a realização do empenho da
despesa. Este impedimento deverá ser formalmente comunicado ao Poder
Legislativo no prazo de 120 dias da promulgação da lei orçamentária pelos
Poderes Executivo ou Judiciário, pelo Ministério Público ou Defensoria Pública
(artigo 166, parágrafo 14, I).
Sendo insuperável o impedimento, o
Poder Legislativo em 30 dias indicará ao Poder Executivo o remanejamento da
programação orçamentária daquela verba (artigo 166, parágrafo 14,
II), o qual deverá encaminhar esta reprogramação como projeto de lei em até 30
dias, ou até a data de 30 de setembro (artigo 166, parágrafo 14,
III).
4) Quando a
transferência obrigatória da União para a execução da programação decorrente de
emendas parlamentares individuais for destinada a Estados, ao Distrito Federal
e a Municípios, não estará condicionado à adimplência do ente federativo
destinatário e não integrará a base de cálculo da receita corrente líquida para
fins de aplicação dos limites de despesa de pessoal de que trata o caput do art. 169 da
Constituição Federal.
5) Contudo, a vinculação de 1,2% poderá também ser contingenciada caso possa implicar em descumprimento da meta de superavit primário estabelecido na lei de diretrizes orçamentárias.
Desse modo, à guisa de exemplo, em
2015, o
governo teria de executar, R$ 7,699 bilhões em emendas parlamentares
individuais. No entanto, houve o contingenciamento de tais emendas impositivas na mesma proporção do corte nas despesas
discricionárias e assim reduziu-se em 35,4% o volume de gastos da rubrica
originada por emendas parlamentares impositivas para R$ 4,636 bilhões.
6) A Emenda
Constitucional nº 86 estabeleceu que a União deverá aplicar montante não
inferior a 15% da receita corrente líquida do respectivo exercício financeiro
(artigo 198, parágrafo 2o, I).
7) De resto,
caberá à lei complementar dispor sobre critérios para a aplicação da referida
execução equitativa (repise-se, significa a definição da fórmula pela qual se
dará a execução obrigatória e impessoal das emendas parlamentares individuais),
além de procedimentos que serão adotados quando houver impedimentos legais e
técnicos, cumprimento de restos a pagar e limitação das programações de caráter
obrigatório, em relação as quais fizemos referência no item anterior.
Por Airton Portela, Professor, Juiz Federal, ex Analista, ex-Advogado da União e ex-Procurador Federal.
Por Airton Portela, Professor, Juiz Federal, ex Analista, ex-Advogado da União e ex-Procurador Federal.
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